"Noventa minutos, uma bola, onze jogadores para cada lado abraçados por uma multidão em júbilo, uma massa exultante que se vai dividindo e esmorecendo, enquanto o tempo decorre e na proporção dos golos metidos nas respectivas balizas. Um balneário vedado aos demais e onde, ao que parece, acontece muito mais do que uma troca de roupa e massagens nos gémeos. E é isto. O futebol para mim é isto. Há contudo variáveis a incluir: se os jogadores são giros e morenos, pode abrir-se uma excepção para alguns louros, ostentam um belo par de pernas e um torso de fazer ruborizar a menos benta das mulheres. A propósito acho um nojo que a UEFA ou a FIFA ou lá quem foi, tenha instituído essa tal regra de marcar falta ou mostrar cartão amarelo aos rapazes que em explosão de felicidade arremessam à maneira masculina as camisolas transpiradas e ostentam os torsos bem definidos. É que, a menos que compremos uma dessas revistas que se ocupa da vida alheia, o povo em austeridade perdeu a oportunidade de ver os abdominais trabalhados do nosso Cristiano Ronaldo e do nosso Nani. Isso sim, é grosso modo, futebol. O mesmo é válido para os treinadores. Alguns, evidentemente. Outros não só podem como devem manter as camisolas, camisas e blazers, e preservar-se e preservar-nos de visões dantescas. O resto é como digo: um campo, onze robustos e atléticos jovens homens transbordando testosterona para cada lado, duas balizas, uns quantos que supervisionam os excessos dos miúdos, outro que gesticula do banco e pronto. Como em outras situações, parece que estou errada.
Devia tê-lo percebido naquele dia em que um amigo holandês me mostrou ufano um livro sobre a vitória dos holandeses sobre os alemães. Recuava aos nos anos oitenta e o livro estava recheado de imagens de homens cabeludos vestidos de laranja e outro igualmente cabeludos e de bigode mas vestidos de branco. Dizia ele que os holandeses toleravam tudo, menos os alemães. Bela tolerância. Fiquei impressionada. Devia tê-lo entendido naquele dia em que sentada na esplanada da Mexicana, um colega benfiquista recusou a água com gás que o empregado lhe trouxera. Diz que era do Sousa Cintra e num outro dia em que, ao passarmos pela montra de uma loja de electrodomésticos, esse mesmo afirmou que não comprava nada marca Phillips. O PSV tinha derrotado o Benfica e isso não se faz.
Acontece que ontem o Chelsea derrotou o Bayern de Munique. Diz que era um jogo importante. Para mim apenas um jogo de futebol. Visto por um outro prisma, um jogo de futebol de duas equipas provenientes de duas cidades que estão nas minhas preferências: Londres em grande destaque e Munique com carinho. O meu mundo por uma Brezel e um Weissbier na Augustiner. Mas não. A derrota dos alemães foi a oportunidade perfeita para aguçar o ressentimento contra os alemães. Como toda a gente sabe, o povo não deve ser confundido com os seus governantes. Cruzes credo se me confundem com o Passos Coelho ou com o homem do ‘coiso’. Angela Merkel não é a Alemanha nem os alemães. Nada disso interessa. Ontem quem perdeu foi a Merkel e a supremacia alemã. A derrota de Merkel ontem no Arena de Munique fez o povo acreditar que ainda há esperança de correr com os alemães. Pouco importa se era o Bayern, o Mönchengladbach, ou o Hertha de Berlim. Podia até ser o FC Badenia St. Ilgen Nunca a Schadenfreude foi ironicamente tão bem ilustrada. E eu a pensar que o futebol eram onze caramelos e uma bola".
Leonor Barros
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